quarta-feira, 25 de abril de 2018

Braga, na segunda metade do séc. XX ... História contada pelos calendários de bolso (4) - "A Brasileira"

Nem só de casas que já não existem se faz a história. Aquelas que sobreviveram e se mantém, têm também a sua história para contar. A luta pela sobrevivência é na maior parte dos casos, bem mais rica, que a história de uma morte e das circusntâncias que a envolveram. Por isso, há que falar dos vivos também.
Assim, trago-vos hoje um conjunto de calendários de uma das mais emblemáticas casas comerciais da cidade de Braga.
Sim, trata-se de "A Brasileira"...
Inaugurada em 1907 no Largo Barão de S. Martinho, mesmo no centro da cidade de Braga, alargada em 1911  para o prédio anexo da Rua de S. Marcos e remodelada em 1929 com intervenção do arquitecto Moura Coutinho, pode-se dizer que o café mais aromático da cidade de Braga que nunca teve televisão, tem sido, ao longo dos tempos, um estabelecimento marcante do quotidiano da nossa cidade também muito procurado e apreciado pelos turistas e forasteiros que nos visitam.
Muito antes da era do plástico, nela também já se vendia café ou cevada avulso, embaladas em cartuchos de papel atados com cordel.
A venda de café, moído na hora, um cheiro único e um "ronronar" quase constante da máquina de moer café, conferiam-lhe um romantismo especial.
Sem ter grandes conhecimentos na matéria eu atrever-me-ia a dizer que sendo o café o produto mais conhecido de"A Brasileira Velha" (Velha, porque entretanto surgiu em 1930, A Nova Brasileira que não tinha nada a ver com a Velha - muita gente pensa que seria dos mesmo proprietários, mas não, A Nova Brasileira foi uma ideia de José Cerqueira Gomes), esta é também conhecida pela cevada (alternativa mais económica ao café e que é bastante consumida pelos bracarenses, seja por uma questão económica, mais saudável ou por gosto).
Assim, porque tinha produtos para todos os estratos sociais, pode-se seguramente afirmar que, naquela época, poucos teriam sido os bracarenses que nunca teriam entrado naquele espaço, quer seja para passar algum tempo sentado à mesa, para tomar um café ou uma "cevadinha", para ponto de encontro, para dar duas de "treta", ou para adquirir café ou cevada avulso e levar para casa.
"A Brasileira" teve vários gerentes, mas um dos que mais se terá distinguido, sem desprimor para os restantes, quanto mais não seja só pelo longo período em que o foi, terá sido Mário Joaquim Queirós (entre 1932 e 1977).
E é no período da sua gerência que foram editados maior parte dos calendários a seguir apresentados e que têm algumas características especiais, mas a que mais se destaca é sem dúvida o serem perfumados com "Chipre Imperial", da Fábrica Confiança, de Braga. Ainda hoje, passados mais de 50 anos é possível sentir aquele aroma profusamente impregnado (o que nos leva a pensar o quão agradável seria andar com um calendário daqueles no bolso - aliado ao aspecto prático de nele também constarem os horários dos comboios e das carreiras da Viação Automotora entre Braga e o Porto).
Não sei se esta opção de perfumar os calendários se deveu ao facto de um dos sócios de Mário Joaquim Queirós ter sido Manuel dos Santos Pereira, director da Saboaria e Perfumaria Confiança, mas é provável que daí tenha derivado.
Consta terem sido emitidos 1000 exemplares de cada, o que nos levaria à questão de saber quantos deles ainda andarão por aí (quiçá, entre páginas, perfumando o enredo de qualquer romance) mas mesmo desconfiando que por uma questão fiscal (imposto de selo) possam ter sido emitidos mais do que o milhar declarado, arriscaria a dizer que muitos deles se perderam e que muito poucos perdurarão. Estes exemplares aqui apresentados são religiosamente guardados com a noção que constituem verdadeiras jóias do nosso património que não se podem perder.
Sobre "A Brasileira", haveria muito mais a dizer, mas aquilo que fica, da minha parte, são mesmo os calendários. Cada um extrairá, para si os aspectos mais curiosos. Aqui estão alguns desses exemplares:




























 








domingo, 22 de abril de 2018

Braga, na segunda metade do sec XX... história contada por Calendários de bolso (3)

Hoje vou apresentar um conjunto de calendários da extinta "Casa Grulha" (um incêndio, julgo que em 2004, terá de forma definitiva, terminado com a existência desta casa)
Considerando que apenas são apresentados calendários de 1974 (emitidos em finais de 1973) é possível que esta data esteja associada a uma mudança de proprietário/gerente por volta desta data.
 
Desde logo conclui-se que seria uma casa especializada nas famosas papas de sarrabulho, muito procuradas pelos forasteiros.
Que, no tempo em que ter um automóvel não era para todos, o turismo em Braga era feito muito à custa de grupos excursionistas (era frequente ver camionetas de excursão paradas no Campo da Vinha provenientes de outras paragens mais ou menos distantes - era esta a forma principal de conhecer o país).
Assim, era normal que os restaurantes e outras casas de pasto, tivessem como um dos principais alvos, estes grupos (atendendo ainda que para os residentes na cidade, contrariamente ao verificado nos dias de hoje, ir a um restaurante era um luxo a que muitos não podiam aceder). 
É também verdade que alguns destes grupos de excursionistas poderiam padecer do mesmo mal, isto é,  também não seriam muito endinheirados, situação em que o farnel era a alternativa mais económica e funcional.
Curioso que, parando as camionetas por norma no Campo da Vinha, a cidade nunca ofereceu a estes excursionistas um local digno e apropriado para estes degustarem os seus farnéis. Nesse aspecto a cidade de Braga não era muito convidativa.
Na ocasião era importante parar perto do centro da cidade (as paragens eram curtas e fosse para visitar a cidade, por regra o centro, ou para almoçar ou jantar, era preciso estar perto do centro e dos restaurantes).
Por isso o parque da Ponte, por exemplo, embora reunindo algumas das condições ideiais nunca foi muito utiizado como local de paragem destes grupos de excursionistas.
Os jogos de futebol, por serem sempre aos Domingos à tarde, proporcionavam uma boa ocasião de negócio, dado que os adeptos visitantes procuravam satisfazer os seus apetites gastronómicos tendo como alvo os pratos regionais, e aí as Papas de sarrabulho e os Rojões à moda do Minho levavam a dianteira.
É neste contexto que a Casa Grulha se situaria (beneficiando ainda de uma localização execepcional - meio caminho do centro da cidade para a estção da CP). 
De acordo com Evandro Lopes, um ilustre bracarense sempre atento, em comentário no facebook refere que a " Casa de Pasto o Grulha, pertencia a Alfredo Grulha embora quem estivesse à frente do negócio era a sua mulher, visto ele ter uma oficina de fabricação de roupa de trabalho na Rua Nova de Sousa...
Mais tarde foi passado à melhor cozinheira que tinham, a mulher do António Guimarães da família dos "Cerejas"  que era proprietário do café Académico, na Rua de S. Vicente." (teria sido por volta de 1973?)
Esta afirmação é confirmada com a indicação simultânea dos telefones das duas casas nos calendários que emitiam, culminando com um verso igual no calendário das duas casas, provando que estas foram casas irmãs, sendo referido António Soares Guimarães nos calendários do Café Bar Académico (algo que se vai repetindo ao longo dos anos seguintes).

 
Importa ainda referir que no calendário do Café Académico (casa suspeita!), em 1993 é referido que a Casa Grulha seria a Casa mais antiga da cidade. É possível que sim.


E em outros comentários de "facebookianos" bracarenses é possível obter algumas referências interessantes, de episódios envolvendo bracrenses, que por ocasião da II guerra mundial, partidários de uma facção, tinham por hábito frequentar também esta casa.

Face à importância desta casa para a história de Braga, e para que não caia no esquecimento, ficam pois por isso, um conjunto de outros calendários da "Casa Grulha", sempre fieis a um mesmo tipo de padrão.
A verdadeira história da casa, terá de ser contada por outros.